Ela não queria ser grossa. Só estava cansada. E sabia que, naquele lugar, qualquer fagulha podia virar incêndio. Quando a farpa foi retirada, Angelina sentiu o alívio imediato, não tanto pela dor, mas por ter sido tirada, por poder se concentrar em qualquer coisa que não envolvesse cadáveres ou silêncio demais. Angelina arqueou uma sobrancelha, os cantos dos lábios finalmente se curvando em um esboço de sorriso. — Tocava direto... 'Here Comes the Sun', eu acho. Meio irônico agora, né? — Comentou, deixando o sarcasmo leve escapar, mas sem qualquer intenção venenosa. Começaram a andar juntas, e Angelina soltou uma risadinha nasal, curta. — Se curtia, deveria ter dado no pé antes da trilha sonora virar silêncio mortal. — Ela olhou para a lateral da cabana, onde pilhas de lenha improvisadas estavam mal empilhadas. Parte de si só queria voltar pra dentro e fingir que nada existia, mas a outra parte, a que sabia que sobrevivência envolvia trabalho, sempre ganhava. Quando a sugestão veio, ela assentiu com a cabeça, relaxando um pouco. A verdade é que, naquele mundo novo e sufocante, qualquer conversa normal, qualquer lembrança boba sobre música ou rádio, era bem-vinda. — Sabe… às vezes eu me pego pensando no primeiro dia de aula na faculdade. Naquela palestra insuportável sobre ética, eu só queria estar em outro lugar, qualquer lugar. Pois é. — Ela riu baixo, abafado, como se estivesse contando uma piada para si mesma. — Devia ter sido mais específica no pedido.
não se intima com a nuança ríspida que oscilou dos lábios de angelina . ora , ninguém ali está em pleno juízo ! as emoções oscilam e são razoáveis de serem explicadas ; a própria está abalada e volúvel a maior parte do tempo . como você preferir . replicou com suavidade diante à primeira negativa , os ombros se elevam e depois relaxam quando expele a tensão contida na caixa torácica . lembrei de uma coisa aleatória . não demora mais do que três segundos para que retire a farpa . um ínfimo instante para que pense — quase que falhamente — em outra coisa que não seja o cadáver no andar de cima . não tinha uma música na rádio da faculdade ? era beatles ? a sentença é mais para distrai-la do incômodo momentâneo , onde se põe a caminhar ao lado dela diante à sugestão . será que quem morava aqui curtia esse tipo de música ? estalou a língua no céu da boca , entretida , quando se ofereceu indiretamente para ajudá-la . aposto que a gente consegue carregar mais lenha juntas .
Seus dedos se fecharam ao redor do ferimento, como se pudesse simplesmente ignorá-lo até desaparecer. Ela manteve os dedos fechados sobre a palma machucada, sentindo a pontada incômoda da farpa de madeira presa à pele. Nada comparado ao resto do que estavam passando. — Não precisa. — Sua resposta saiu automática, curta demais, quase ríspida. — Já vai sair sozinha. — Feridas pequenas, coisas palpáveis, essas eram fáceis de lidar. O silêncio se alongou. Cassandra não desistiu, e isso foi o suficiente para fazê-la soltar um suspiro. Com relutância, Angelina estendeu a mão, mas desviou o olhar, como se aquilo não significasse nada. — Na verdade, não. Mas agora estou pensando seriamente em buscar lenha, só pra parecer mais útil. — Ela brincou, um sorriso de canto surgindo enquanto observava a outra trabalhar na remoção da farpa. — Estava cuidando da limpeza e tudo aqui parece que não foi tocado há décadas.
quanta teimosia ! não se surpreende com a resistência alheia , afinal é como um bônus ser a irmã mais velha de uma família grande cheia de garotos . desenvolveu a paciência como um super poder — ou , quiçá , apenas esteja particularmente zen . me deixe ver sua mão ! quem vê pensa que vai ler as linhas da vida de muse , porém , apenas quer ajudá-lx a retirar a maldita farpa de madeira . você estava buscando lenha ? inqueriu , cuidadosa , quando tenta espiar a mão com certa cautela . é estratégia , porém , em fazer um grande caso para desfocar a tensão sobre o cadáver no andar de cima .
Se havia um safe space para Daphne além de seu chalé, e esse com toda a certeza era a arena de treinamento, ainda mais sabendo que podia moldá-la à sua preferência. Por norma não gostava de áreas escuras, mas a forma como estava configurada para aquela floresta, parecia combinar com o seu estado de espírito naquele momento, além de ser perfeita para não precisar de se encontrar com outros semideuses. No entanto, seu foco foi desviado do manequim que estava prestes a derrubar, para a semideusa um pouco mais à frente. Precisando de um ponto onde a ver melhor, a filha de Ares tentou não fazer barulho enquanto escalava uma enorme pedra e se sentou observando os movimentos da outra campista. Seu lado de instrutora estava vindo ao de cima, avaliando o que a filha de Melione fazia em relação àqueles manequins, avaliava também a forma como segurava a arma e balanceava o corpo. Tentou ao máximo ficar calada, mas aquilo a estava aborrecendo e teve de falar assim que a viu se desequilibrando e cambalear. Com um suspiro se levantou, prendendo a arma que mais usava às costas e se aproximou de Cassandra. Aquela era a questão usual quando reparavam no tamanho do machado em comparação a ela, por isso não se surpreendia. "É tudo uma questão de equilíbrio, e alguma força." E confiança, pensou, mas acabou por deixar para si. Dizia aquilo como se fosse simples, como se não tivesse quase se matado a treinar para empunhar aquela arma com orgulho.
─ 𝒕𝒉𝒊𝒔 𝒊𝒔 𝒂 𝒄𝒍𝒐𝒔𝒆𝒅 𝒔𝒕𝒂𝒓𝒕𝒆𝒓 𝒇𝒐𝒓 @wrxthbornx
Repleta de árvores mortas e arbustos frondosos, a arena de treinamento estava magicamente configurada para se parecer com uma floresta naquela noite. Cassandra estava em busca de um momento em que o local estivesse pouco ou nada movimentado e sem testemunhas para a vergonha que talvez passasse. Depois de uma década vivendo no Acampamento, suas habilidades de combate tinham se desenvolvido de forma satisfatória, mas por algum motivo, armas grandes e pesadas ainda a irritavam profundamente. Entretanto, após os últimos ocorridos, parecia razoável que a semideusa aprendesse a matar coisas através de todos os meios possíveis. No lugar de monstros, manequins em tamanho humano a cercavam. Era necessário começar de algum lugar, afinal. Finas linhas de suor escorriam por suas têmporas enquanto as duas mãos tentavam balancear uma espada longa. Cassandra golpeou o ar de forma questionável, já que seu equilíbrio parecia tê-la abandonado. Cambaleando de volta à posição inicial e xingando em voz baixa, a filha de Melinoe finalmente percebeu a presença da outra campista no recinto. ❝ make it look convincing. ❞ As palavras da filha de Ares ecoaram pelas paredes de pedra e, para a irritação de Cassandra, atingiram seu ego como flechas certeiras. Ela acabara de ser surpreendida pela pior pessoa possível em um momento como aquele. Cassandra ignorava a maioria dos feitos dos colegas, mas era impossível negar a proficiência de Daphne com armas em geral. — Quer saber? — arfou, com a voz carregada de frustração enquanto tentava recobrar seu fôlego após o susto. — Que tal você me contar como diabos alguém consegue segurar uma arma desse tamanho? — Acenou com a cabeça, indicando o enorme machado preso às costas da outra.